quarta-feira, outubro 16, 2024

1/3 das crianças brasileiras têm anemia, aponta levantamento inédito

Uma pesquina inédita revela a prevalência de 33% de anemia ferropriva (aquela causada por falta de ferro) em crianças brasileiras de zero a sete anos. Ou seja, 1/3 das crianças do país estão anêmicas. Uma criança com baixos índices de ferro e considerada anêmica pode ter muitos prejuízos, como falta de disposição para brincar e isolamento, déficit de aprendizado e prejuízos para o desenvolvimento intelectual, além de prejuízo imunológico.

“No nível populacional, uma prevalência de anemia maior que 4,9% já é considerada uma importante questão de saúde pública. Quando há prevalência superior a 40%, é classificada como grave problema de saúde pública”, explica Carlos Alberto Nogueira-de-Almeida, docente do Departamento de Medicina (DMed) da UFSCar e coordenador do estudo.

A análise – o maior estudo já publicado sobre anemia ferropriva em idade pediátrica no Brasil – foi liderada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e levou em consideração 134 estudos anteriores (publicações), envolvendo 46.978 crianças, divulgados de 2007 a 2020.

MEsmo nas regiões mais ricas do brasil – sul e sudeste, a prevalência é alta

O estudo também mostrou diferenças significativas entre as regiões geográficas. “A diferença entre as regiões foi menor do que esperávamos. Porém, mesmo nas regiões mais ricas do País – Sul e Sudeste, a prevalência é alta. Estamos diante de um quadro preocupante, tendo em vista que o Brasil é um país em desenvolvimento, mas não de extrema miséria”, analisa Nogueira-de-Almeida.

Um outro dado relevante é a estabilização da prevalência ao longo dos anos. “As curvas dos gráficos obtidos na pesquisa comprovam que a prevalência da anemia se mantém estável de 2007 para cá, sem aumentar ou diminuir. Isso significa que as iniciativas para controle da doença parecem não ter tido impacto, o que também nos causa preocupação”, registra. Ele lembra que o Brasil vem adotando ações para prevenir e controlar a anemia, como a criação, em 2015, da Estratégia de Fortificação da Alimentação Infantil com Micronutrientes (vitaminas e minerais) – NutriSUS.

Dr. Carlos Alberto Nogueira de Almeida opiniões - Nutrólogo Ribeirão Preto  - Doctoralia
Carlos Alberto Nogueira-de-Almeida

Boa Alimentação como solução

O Prof. Nogueira-de-Almeida elenca diversas hipóteses para explicar uma prevalência tão alta. Foram apontados fatores determinantes como o elevado índice de mães com anemia, o baixo índice de aleitamento materno e alimentação inadequadas. “Muitas vezes, as crianças que não recebem leite materno acabam consumindo leite de vaca antes de um ano, idade imprópria para isso. Além de não ter ferro, este leite ajuda a perdê-lo do organismo, já que provoca pequenas hemorragias na mucosa intestinal e o seu cálcio também acaba levando o ferro para as fezes”, relata.

A alimentação complementar, introduzida a partir dos seis meses, pode também ocasionar anemia. “Não temos hábito de usar cereais fortificados, por exemplo. Muitas famílias utilizam uma alimentação com base na farinha de fubá e outros ingredientes caseiros, que não contêm ferro.”

No Brasil, estima-se que 90% dos casos de anemia são por falta de ferro, e a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera a doença como um indicador de pobreza de nutrição e de saúde, que compromete a qualidade de vida e contribui para a mortalidade infantil.

Os dados alarmantes são essenciais para se pensar em políticas públicas nacionais, que consigam diminuir esses índices de prevalência. A solução é complexa e envolve diversas camadas de estratégias de políticas públicas. “Algumas ações urgentes consistem na criação e no fortalecimento de políticas públicas – de distribuição de renda, para se obter recursos para compra de alimentos fortificados em ferro; e de educação nutricional, para fomentar uma conscientização sobre a importância dos alimentos, seus nutrientes e vitaminas, que muitas famílias não têm”, sintetiza.

Nogueira-de-Almeida também alerta que ações imprescindíveis de saúde também podem mudar essa realidade. Entre elas estão o pré-natal gratuito e de boa qualidade às mães sem condições financeiras e o estímulo para o aleitamento materno.

+ Os resultados do estudo – intitulado “Prevalence of childhood anemia in Brazil: still a serious health problem. A systematic review and meta-analysis” – foram publicados em julho de 2021, na revista Public Health Nutrition, da Cambridge University Press. Assinam o artigo, além de Nogueira-de-Almeida, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ) e profissionais da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) – Fábio da Veiga Ued, Luiz Antonio Del Ciampo, Edson Zangiacomi Martinez, Ivan Savioli Ferraz, Andrea Aparecida Contini, Franciele Carolina Soares da Cruz, Raquel Farias Barreto Silva, Maria Eduarda Nogueira-de-Almeida e Joel Alves Lamounier.

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